Políticas públicas de proteção à infância: o que está sendo feito por crianças vítimas de violência doméstica no Brasil

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Iniciativas públicas avançam em meio a desafios estruturais e culturais; especialistas cobram maior integração entre setores e mais investimento em prevenção.

São Paulo – A violência doméstica contra crianças e adolescentes continua sendo uma das formas mais silenciosas e devastadoras de violação de direitos no Brasil. Segundo dados do Disque 100, em 2024, foram registradas mais de 100 mil denúncias envolvendo violência física, psicológica, sexual ou negligência contra menores de idade. Embora o número seja alarmante, especialistas alertam: a subnotificação ainda é um dos maiores obstáculos no combate ao problema.

Em resposta a essa realidade, diversas políticas públicas vêm sendo implementadas e aprimoradas em todo o país. Programas como o Família Acolhedora, o Sistema de Garantia de Direitos, e o Serviço de Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI) têm papel central na proteção e acompanhamento de vítimas.

Rede de proteção e articulação intersetorial

A proteção integral às crianças e adolescentes está garantida na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), mas, na prática, a atuação eficaz depende da articulação entre diferentes órgãos: Conselhos Tutelares, Ministério Público, Judiciário, escolas, unidades de saúde e assistência social.

“O grande desafio está na fluidez da comunicação entre esses setores e no fortalecimento da rede. Ainda temos gargalos, especialmente nos municípios menores, que enfrentam escassez de recursos humanos e financeiros”, explica a defensora pública Ana Beatriz Ramos, coordenadora de direitos da infância e juventude em São Paulo.

Para a ex-vereadora Adriana Ramalho, que atuou ativamente em pautas sociais durante seu mandato, o problema exige prioridade política. “A violência doméstica contra crianças precisa ser tratada como emergência pública. Quando a violência entra em casa, o Estado precisa entrar também — com proteção, acolhimento e responsabilização dos agressores”, afirma.

Iniciativas que têm dado certo

Em algumas cidades, boas práticas vêm se destacando. É o caso de Belo Horizonte (MG), onde o projeto Crescer Sem Violência atua de forma integrada com escolas da rede pública para detectar sinais de abuso já nos primeiros sintomas comportamentais.

Outro exemplo é o estado do Ceará, que implementou o protocolo Escuta Protegida, regulamentando o depoimento especial de crianças vítimas de violência, conforme previsto na Lei 13.431/2017. A iniciativa busca evitar a revitimização e garantir acolhimento humanizado durante os processos judiciais.

Em São Paulo, Adriana Ramalho destaca a importância da aproximação entre os gabinetes parlamentares e os serviços da assistência social. “Durante meu mandato, visitei abrigos, ouvi conselheiros tutelares e batalhei por recursos para centros de acolhimento. É nesse diálogo com a ponta que nascem políticas públicas eficazes”, lembra.

Prevenção e educação: os caminhos mais eficazes

Especialistas defendem que o foco das políticas públicas deve ir além da punição e do acolhimento. “Prevenir é essencial. Isso passa por formar professores, agentes de saúde e até vizinhos, para que saibam reconhecer os sinais e saibam como agir. E também por educar emocionalmente nossas crianças e famílias”, afirma a psicóloga Juliana Leal, pesquisadora da Fiocruz.

Adriana Ramalho reforça a importância da educação como ferramenta de transformação social. “Temos que falar sobre afeto, respeito e limites desde cedo. E temos que formar adultos mais conscientes. Não se combate a violência doméstica apenas com delegacia — mas também com escola, com cultura e com saúde mental acessível.”

Desafios e perspectivas

Apesar dos avanços, ainda há um longo caminho a percorrer. A morosidade nos processos judiciais, a baixa cobertura de serviços especializados em áreas rurais e a ausência de políticas estruturais de combate à pobreza são apontadas como fatores que perpetuam o ciclo de violência.

Para 2025, o Ministério dos Direitos Humanos anunciou a ampliação do orçamento destinado ao Sistema de Garantia de Direitos, com prioridade para capacitação de profissionais e informatização das denúncias.

“Proteger uma criança é proteger o futuro do país. E isso exige compromisso político, social e ético de toda a sociedade”, conclui a defensora Ana Beatriz.

Adriana Ramalho reforça: “A violência contra a infância não pode ser normalizada nem ignorada. Toda criança merece crescer segura, amada e livre do medo. Essa é a base de qualquer sociedade justa.”

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