Pesquisa da UFPA mostra que até em cenários otimistas de emissões de carbono, espécies já ameaçadas da Amazônia poderão perder até 100% de seu habitat natural.
A Amazônia perdeu quase 17% de suas áreas nativas nos últimos 50 anos — e 14% dessa perda foi causada pela conversão em terras agrícolas. Esse desmatamento afeta diretamente a biodiversidade da floresta, reduzindo a qualidade dos habitats, comprometendo as interações ecológicas e impactando serviços essenciais, como a polinização e a dispersão de sementes.
As mudanças climáticas, somadas à perda de habitat, alteram a distribuição das espécies e afetam especialmente grupos mais sensíveis, como aves e primatas. Esses animais não apenas desempenham funções ecológicas vitais, mas também servem como indicadores da saúde ambiental, devido à sua sensibilidade às alterações no ecossistema.
Com grande diversidade de espécies — incluindo tanto aquelas mais adaptáveis quanto as altamente dependentes de ambientes intactos —, aves e primatas enfrentam uma ameaça crescente. Fragmentação de florestas, aumento das temperaturas e redução das chuvas são fatores que podem levar à extinção diversas espécies já vulneráveis.
Modelagem prevê futuro alarmante para espécies amazônicas
Pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) usaram modelagem de distribuição de espécies para prever como 43 espécies de aves e 35 de primatas ameaçados responderão às mudanças climáticas nas próximas décadas. A metodologia combina dados atuais de distribuição com projeções climáticas de temperatura e precipitação, utilizando os cenários do IPCC.
Dois cenários foram considerados: o SSP245 (mais otimista), que pressupõe controle moderado das emissões, e o SSP585 (mais pessimista), com emissões descontroladas. Mesmo no cenário otimista, os resultados são preocupantes: várias espécies podem perder quase toda sua área de sobrevivência natural.
Entre as aves, 29 espécies podem perder mais de 80% de seus habitats no cenário mais brando. Vinte delas não terão nenhuma área adequada para viver. No pior cenário, até 36 espécies ficariam sem habitat. Já para os primatas, 90% das espécies podem ter suas áreas severamente reduzidas — até mesmo espécies criticamente ameaçadas podem perder tudo.
A importância ecológica das aves e a crise entre os primatas
Espécies como o jacamim-de-costas-escuras e o mutum-de-penacho, já restritas a pequenas áreas, correm alto risco de desaparecer. A extinção de aves frugívoras, como a ararajuba, pode comprometer a regeneração das florestas, prejudicando diretamente o equilíbrio ecológico e a biodiversidade vegetal.
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Para os primatas, os impactos são igualmente dramáticos. Espécies endêmicas como o sauim-de-coleira e o caiarara poderão perder até 98% e 100% de seus habitats, respectivamente. Além das mudanças climáticas, o desmatamento intensifica o risco, comprometendo as chances de sobrevivência de espécies já fragilizadas.
Áreas protegidas são insuficientes
Apesar de o Brasil possuir uma das maiores redes de áreas protegidas do mundo, essas regiões são ineficientes para conservar primatas e aves ameaçados. A degradação dentro dessas áreas, somada à baixa conectividade entre elas, enfraquece sua função de proteção.
Terras Indígenas desempenham um papel essencial na preservação das florestas, mas também enfrentam crescentes pressões ilegais. Entre 2013 e 2021, o desmatamento nessas áreas aumentou 129%, ameaçando tanto a fauna quanto os povos que vivem nesses territórios.
Os pesquisadores da UFPA alertam: sem ações urgentes e políticas públicas eficazes — que combinem conservação ambiental com envolvimento comunitário —, a Amazônia pode testemunhar a extinção de dezenas de espécies e o colapso de seus serviços ecológicos.