Decorador que deu calote em noivas e foi para Paris

Acusado de dar calote em 60 noivas do Distrito Federal e fugir para a França, deixando um prejuízo de R$ 1,315 milhão, o empresário Chrisanto Lopes Galvão Netto foi condenado em 2014 por um caso semelhante. Ele teria que devolver R$ 8,5 mil à professora Débora Vasquez Lemos, de 35 anos, por uma cerimônia de casamento não realizada, mas dois dos cinco cheques entregues em 2012 estavam sem fundos. Em mensagem a uma amiga, o decorador disse não ter dado golpe. "Estou falido", escreveu.

"Quando depositei o quarto cheque, ele voltou. Entrei em contato, e a secretária disse que ele tinha 'tido um probleminha', [que era] para eu tentar em dois meses. Depositei de novo, voltou de novo e ouvi da secretária que não adiantava, que o Netto não teria como me pagar. Ele não me atendia mais. Liguei de outro número, ele atendeu e ainda debochou, falou que a minha dívida era a menor que ele tinha para pagar", conta Débora, que acredita ter sido a "primeira vítima" do decorador.

O casamento foi contratado em outubro de 2011 e agendado para 12 de junho de 2012. Três meses antes, Débora desistiu da cerimônia e fez acordo para rescindir o contrato, com multa de 20%. "Como eu tinha comprado meu vestido, ele disse que ficaria com a peça e acertaria o valor na rescisão. Sempre foi cordial, dizia que meu casamento ia ser de revista, que íamos fazer a prévia no Rio de Janeiro. Foi tudo premeditado, muito bem feito", diz.

A rescisão ficou acertada em cinco cheques de R$ 4.240, totalizando R$ 21,2 mil. Desse valor, R$ 8,2 mil continuam sem ressarcimento. Débora abriu um processo na Justiça para reaver o dinheiro. Mesmo sem constituir defesa, o decorador teve uma decisão parcialmente favorável – o juiz reduziu o valor pedido pela noiva.

"Abri o processo sozinha, sem advogado, e pedi o valor máximo que eu poderia, que era de R$ 12.440 (20 salários mínimos), porque ele fugiu da dívida. A Justiça não conseguiu intimar o Netto, o processo foi julgado à revelia, mas mesmo assim o juiz considerou que o valor era alto demais. Decidiu que eu merecia só o valor dos cheques, sem adicionais", diz a professora. Com correção monetária, o valor a receber hoje é de R$ 10,6 mil.

Com o revés na Justiça, Débora diz que começou a suspeitar de algum favorecimento ao decorador. "Pra mim, ele tinha alguém lá dentro. O oficial disse que não conseguia intimá-lo, fui ver o processo e tinham alterado os três dígitos finais do CEP. Nunca iam achar mesmo", afirma. Enquanto alegava dificuldades financeiras, segundo Débora, Netto Galvão postava fotos em redes sociais com viagens, jantares e festas em outros estados.

Corregedoria
O advogado de Débora, José Carlos Carvalho, diz que chegou a registrar queixa na Corregedoria da Polícia Militar contra Netto, que é policial licenciado da corporação. Segundo ele, a denúncia não teve prosseguimento. "Adverti à PM que, se eles não tomassem providência, ele continuaria a aplicar golpes. Falei: 'olha, esse rapaz vai dar um tombo violento na praça'. Se tivessem me ouvido talvez teriam evitado um golpe dessa magnitude", diz.

A Corregedoria da PM diz que abriu uma sindicância para apurar o caso, mas "não ficou constatada a ocorrência de crime militar ou transgressão da disciplina". O órgão afirma ainda que "ações de cobrança são da esfera da Justiça comum" e não têm relação com a corporação.

Para Carvalho, o militar e decorador é um "estelionatário contumaz" e usava do cargo militar para ganhar a confiança das clientes e, em seguida, para ameaçá-las. "Depois do calote, temos relatos de que ele fazia ameaça velada às vítimas, dizendo que era PM e tinha outras formas de resolver as dívidas".

Até esta sexta (15), a defesa de Débora diz que conseguiu apenas a penhora de R$ 1,9 mil, dinheiro encontrado em duas contas de Netto. Se não houver contestação, o valor deve ser repassado à professora nos próximos meses.

O advogado diz que, após a abertura do processo, todas as tentativas de encontrar Galvão Netto falharam. "Para citar, intimar, foi um deus nos acuda. Não conseguíamos encontrar ele na residência, em lugar nenhum. No processo da Corregedoria, ele já estava licenciado e a PM também não conseguia encontrar. Ele foge, se esconde, dá um jeito", diz Carvalho.

Calote em série
O caso de Débora se soma ao de, pelo menos, 60 outras noivas que registraram queixa na última semana contra o decorador. A delegada-chefe da 3ª DP, Cláudia Alcântara, pediu à Justiça na terça (12) a prisão preventiva de Galvão Netto, mas as investigações indicam que ele fugiu para Paris. Até terça-feira, o prejuízo total era estimado em R$ 1,315 milhão.

De acordo com as vítimas, o empresário enviou uma carta às noivas dizendo que devolveria o dinheiro recebido, mas sumiu e não restituiu os valores.

A empresa do decorador funcionava em uma loja na quadra 303 do Sudoeste. No dia 4, a porta estava trancada e não havia nenhuma identificação. Vizinhos do local disseram que os funcionários foram dispensados no início do mês e ninguém voltou depois disso.

Registros da Polícia Federal apontam que Galvão Netto embarcou para a capital francesa no último dia 6. "Procuramos o Netto em todos os locais que ele poderia residir e em todos ele não estava. Ele mudou desses lugares e ninguém sabe o atual endereço dele no Brasil. Ele mudou dos endereços e não deixou nada. Está claro que ele está fugindo da ação policial", disse Cláudia.

Galvão Netto será indiciado nos 60 casos por estelionato. Se condenado, ele pode pegar de 1 a 5 anos por cada ocorrência registrada.

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