O prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal (PP), participou de reuniões ‘extraoficiais’ com um doleiro que comandava, em Brasília, esquema de corrupção semelhante ao escândalo conhecido como petrolão. Pelo menos é o que insinuam áudios divulgados pela revista Veja, em sua página na internet, de conversas entre o doleiro Fayed Traboulsi e o atual presidente da Câmara Federal, deputado Waldir Maranhão (PP-MA).
De acordo com a publicação divulgada nesta sexta-feira (6), o substituto de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que foi afastado do cargo após decisão do Supremo Tribunal Federal, é um parlamentar do chamado baixo clero do Congresso Nacional. Como tal, ele seria um dos investigados na Operação Lava Jato por recebimento de vantagens indevidas tanto do doleiro Alberto Youssef quanto do doleiro Fayed Traboulsi.
“Fayed comandava, na capital da República, um esquema de corrupção paralelo à rede de Youssef no petrolão. Por vezes, a dupla de doleiros fazia parcerias pontuais. Como Fayed mantinha suas operações em Brasília, nas emergências o paranaense Youssef utilizava seus serviços – o esquema brasiliense funcionava como uma espécie de sucursal do banco clandestino do operador do petrolão”, explica a revista.
Um dos esquemas revelados durante a Operação Miqueias, ação em conjunto da Polícia Federal e o Ministério Público do Distrito Federal, era a venda de títulos podres a fundos de pensão de servidores públicos, que causou prejuízo estimado de R$ 50 milhões. A operação ilegal era intermediada por políticos, que levavam parte dos lucros da organização criminosa, para usar sua influência política e cooptar novos integrantes para a quadrilha.
“Em um dos casos que caíram na malha da investigação, Waldir Maranhão aparece como intermediário de um "negócio" de 6 milhões de reais com a prefeitura de Santa Luzia, no interior maranhense – com a ajuda do agora presidente da Câmara, a quadrilha vendeu títulos para o fundo de pensão dos servidores municipais. Em troca, o deputado recebeu 1% da operação: 60 000 reais”, revela a Veja.
Durante as investigações, o presidente da Câmara Federal foi flagrado em conversas telefônicas com o doleiro enquanto o esquema ainda estava no auge. Em alguns dos diálogos, gravados em novembro de 2012, Waldir Maranhão intermedia a aproximação de Fayed com o recém-eleito prefeito Alcides Bernal. Confira:
Doleiro – Fala, meu querido!
Deputado – Meu irmão!
Doleiro – Tudo bem, irmão?
Deputado – Veja só: o Bernal está em Brasília e deixei o Luís Carlos aí com a missão de levá-lo ao seu encontrou, viu?
Doleiro – Pois é, estou aguardando eles, inclusive. O Luís Carlos disse que tá com ele aí, né?
Deputado – Como eu vim para o Tocantins, eu tratei só por telefone, mas tá caminhando, viu?
Doleiro – Tá. Então eu fico no aguardo. Eles vêm agora à tarde, né
Deputado – É interessante a sua conversa.
Duas semanas após o encontro em que o prefeito de Campo Grande foi apresentado ao doleiro, Waldir Maranhão volta a marcar um encontro entre os dois, em Brasília. A seguir:
Doleiro – Fala, chefe.
Deputado – Meu irmão, tudo bem?
Doleiro – Tudo.
(…)
Deputado – Deixa eu lhe dizer: amanhã quem vai estar aqui é o Bernal, lá de Campo Grande. Já teve com ele, né?
Doleiro – Já, sim. Eu já estive conversando da outra vez com ele. Mas eu tô indo pra São Paulo às oito horas da manhã e volto às duas da tarde.
Deputado – Eu acho assim: se você tiver um tempinho, à noite, eu acho que vale a pena convidá-lo para ter uma conversa social, tá? Uma sugestão, uma sugestão, tá?
Doleiro – Claro, claro (…) Amanhã eu vou te ligar assim que eu chegar aqui em Brasília eu te ligo para você ou fazer contato com ele ou me dar o telefone dele pra mim falar com ele, tá?
Deputado – Eu vou te passar logo o telefone dele porque um convite seu é diferente, viu?
Doleiro – Pois eu estou sem poder anotar aqui.
Deputado – De manhã eu te passo, então. […]
Procurada pela reportagem, a assessoria do prefeito Alcides Bernal informa que “não houveram reuniões com o referido doleiro”, tanto que “não há qualquer comprovação de reuniões, apenas tentativas por parte dos mesmos”. Ainda afirma que “trata-se de uma matéria requentada de 2013, sobre a operação Miqueias”.
“Na época, esta quadrilha criava armadilhas para os prefeitos e tentaram fazer do prefeito Alcides Bernal sua vítima, porém sem sucesso. Como prefeito recém-empossado, encontrou-se com diversas pessoas a pedido de membros do seu partido (PP), porém não há na agenda do prefeito registro de encontros com os citados pela matéria”, aponta.
Por fim, a assessoria garante que “não houve qualquer menção sobre sua pessoa na operação da PF e o prefeito não foi investigado, pois não houve qualquer relação com a quadrilha. O fato de pessoas citarem o nome do prefeito não significa absolutamente nada, como foi comprovado pelas investigações da Polícia Federal”.
Em resposta à revista Veja, o deputado Waldir Maranhão "negou que tenha recebido quaisquer benefícios indevidos, reiterou que já prestou depoimento sobre o assunto, afirmou que 'está à disposição das autoridades para esclarecimentos' e que não tem 'nenhuma' relação com o doleiro Fayed Traboulsi".
Ouça: