Do sushi ao anime: como a cultura japonesa está nos pequenos negócios sul-mato-grossenses

Memória dos 117 anos de imigração japonesa exalta o empreendedorismo oriental em Campo Grande

No dia 18 de junho de 1908, o navio Kasato Maru trouxe ao Brasil os primeiros imigrantes japoneses a bordo, que desembarcaram no país trazendo parte de uma rica cultura, compartilhada por aqui há 117 anos.  Com mais de 130 anos de relações diplomáticas entre Brasil e Japão, os descendentes têm forte presença na população dos estados de São Paulo, Paraná, Pará e Mato Grosso do Sul. A comunidade nipo-brasileira no estado construiu sua identidade a partir dos pequenos negócios em diversos setores, principalmente na gastronomia, que são preservados até os dias de hoje.
Essa trajetória empreendedora se entrelaça com a história da Feira Central de Campo Grande, que neste ano também comemora seu centenário. Os primeiros imigrantes japoneses chegaram ao estado impulsionados pela construção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil e assim fixaram seus negócios familiares na famosa feira de rua que hoje movimenta a economia local e ocupa a Esplanada Ferroviária. Com mais de 15 negócios ativos de proprietários japoneses, incluindo restaurantes, lojas, bancas de doces, hortifrúti e artesanato, a barraca da empreendedora Suelly Shinzato, carrega parte dessa grande viagem.
 

Onigiri é um lanche popular do Japão recheado com diversos ingredientes (Foto: Arquivo Pessoal)
“No início revendia produtos japoneses, aos poucos comecei a fazer os meus, como o manju, okinawa moti (receitas da minha sogra) e dorayaki, este aprendi com minha tia Mizuho e aprimorei no Japão. Aos poucos fomos conquistando clientes e tivemos necessidade de nos formalizar. Fui atrás do Sebrae e fiz vários cursos de empreendedorismo”, conta a neta de imigrantes que fez das receitas de família de província de Okinawa em uma oportunidade para se tornar MEI.

Feira de oportunidades

Campo Grande possui a segunda maior colônia de descendentes Okinawa-Kenjin, que, aos poucos, foram comprando suas terras e cultivando verduras e cereais nas lides agrárias para vender na cidade. Esse foi início da Feirona. Para Suelly, o apoio e a tradição dos sogros feirantes que já trabalhavam com culinária okinawana desde os quatorze anos, foram o principal motivo para assumir a barraca Shinzato Doces e Sushis Orientais, em 2021.  “O desafio hoje é manter a receita original e passar para os filhos e netos. Assim como meus avós, meu pai já dizia: não esqueça das nossas origens”

O ambiente familiar e acolhedor dos feirantes já faz parte das programações dos campo grandenses. O gigante sobá que enfeita a frente da Feira Central, na rua 14 de Julho, representa um prato considerado patrimônio imaterial da cultura e, apesar disso, as opções de consumo do ponto turístico é bastante diversificada. Suelly garante ter uma clientela que prefere consumir sushis e doces mais tradicionais do que os adaptados. “Começamos a levar nossos produtos em festivais da cultura japonesa e eventos que tomaram o gosto do campo grandense”.
 
Suely Shinzato herdou dos sogros uma barraca na Feira Central e hoje, a gerencia com sua família (Foto: Arquivo Pessoal)
As celebrações deste um século de Feira Central está com uma agenda carregada desde abril de 2025. O Sebrae/MS inaugurou essa homenagem promovendo a 17ª edição do Festival do Peixe, uma parceria com a Abrasel/MS que conectou empreendedores da gastronomia e pescaria a novos mercados com o espaço Compre do Pequeno.

Um legado cultural

Essa preservação e adaptação de costumes também se estende a empreendimentos mais contemporâneos. Segundo o empreendedor Flavio Nakazato, o país é símbolo de modernidade e conciliar tradições com a inovação é a chave para influenciar novas culturas. Como fã da cultura pop japonesa, Flavio é diretor executivo do Parada Nerd , o maior evento de cultura pop de Mato Grosso do Sul e já reuniu mais de 6 mil pessoas em uma única edição.

Dragon Ball Z, Naruto e One Piece, é difícil encontrar quem não conheça alguns desses fenômenos da cultura pop japonesa. O Parada Nerd é o evento principal da empresa que tem interesse de combater estereótipos e fomentar a cultura e mercado local de Campo Grande. “Conforme a cultura pop foi ficando mais popular pelo mundo afora, as empresas foram vendo esse público com outros olhos e viram a importância dessa comunidade. Nosso principal papel é mostrar que a cultura japonesa é muito maior que apenas os animes e mangás”.
Parada Nerd é um evento que reúne fãs da cultura pop de todas as idades (Foto: Arquivo Pessoal)
“Eu cresci assistindo os animes (desenhos japoneses) e às séries de super-heróis (tokusatsus), então, quando surgiu a oportunidade de fazer um evento que envolvesse essa temática, foi como unir várias paixões. Essa popularização dos animes e mangás contribuiu muito para que as pessoas tenham mais interesse em outras áreas da cultura japonesa”, compartilha Flavio.

No início de junho, a Princesa Kako, sobrinha do atual imperador japonês Nahurito e membro da família imperial japonesa, chegou à capital para celebrar o marco do “Ano de Intercâmbio da Amizade Brasil–Japão”. Usando uma vestimenta típica do Japão, o kimono destacou a moda herdada do país oriental que é usualmente vista no guarda-roupa dos brasileiros, principalmente no verão. Priscila Kaori vem de uma família que sempre trabalhou com confecção e destaca que a formação em publicidade e propaganda a influenciou a descobrir nessa tradição, novas tendências na pandemia.

“Eu peguei um dos meus kimonos, que eu já tinha, e reproduzi. Claro que com o diferencial, o tecido muda, né? Porque a gente já pensa, não só como hobby para ficar em casa, como estamos numa região muito quente, pensamos em tecidos leves e confortáveis com as estampas diferentes. Eu gosto muito de usar estampas tropicais”, comenta sobre as adaptações do produto para o uso diário.

A marca Kaori Kimonos já participou de várias iniciativas do Sebrae/MS relacionadas a moda autoral, como o Pantanal Fashion Week e nas passarelas, ela procura fabricar kimonos com estampas que remetam ao Pantanal pela fauna e flora da região. “Eu gosto de estar trazendo para as coleções essas duas culturas, Brasil e Japão. Quando as minhas clientes vêm até a gente, elas ficam encantadas quando vêm kimonos tradicionais com aquelas mangas alongadas, a gente tem até uma peça, que é o maior sucesso”, compartilha a empreendedora que deu nome e razão para abrir a empresa pela influência de sua avó Naishi Kawa.

Mesmo com um oceano de distância, a cultura japonesa tem influência em grandes lugares do Brasil e, em Campo Grande, encontra nos pequenos negócios da cidade, desde a gastronomia à moda, um espaço de memória e identidade local.

Mais informações sobre as ações realizadas pelo Sebrae podem ser obtidas pela Central de Relacionamento (0800 570 0800) ou no site ms.sebrae.com.br.

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